segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Intolerância, o maior entrave à acessibilidade

Caio é, aos 4 anos, um cadeirante. E eu sou tida como uma mãe com pulga no traseiro. E, confesso, essa conceituação sobre minha pessoa me incomoda. Assim sou vista, simplesmente porque vivo e levo o Caio para viver. Com cadeira de rodas, sim.
É de cadeira, e muitas vezes dependendo do transporte público, que vamos a médicos, passeios, aniversários. Meu marido é da turma Tudo é Difícil. Eu não. Sou da turma É Assim Nossa Vida! Não vejo drama, mistério ou problema em deixar meu filho viver nas condições que são as dele. E aí, pra se divertir, pra conhecer o mundo e pessoas, a cadeira é apenas um acessório...

Claro que a realidade não é tão poética e nem eu esperava que fosse. Mas podia ser mais fácil, com certeza. Com mais rampas de acesso, com calçadas regulares, com mais ônibus adaptados. Já foi pior, eu sei. Agora, na minha busca pela acessibilidade ideal tenho esbarrado no maior de todos os obstáculos: a intolerância alheia.

Nunca vi, mesmo antes de ter o Caio em minha vida, o deficiente com pena. É a condição dele, independente de qual ela é. Mas as pessoas olham com pena. E essa pena não é sinônimo de compaixão, não se enganem... Infelizmente, o deficiente físico ainda é visto como um estorvo à sociedade. E isso sim, é muito, muito triste.

Semana passada tive problemas mecânicos com meu carro e precisei levar o Caio à fono de ônibus. Passou o primeiro e deixei ir - não era adaptado a cadeirantes. Passou o segundo, idem. Mas me obriguei a entrar no terceiro, ou iríamos perder nosso horário. A cadeira do Caio é leve, estreita, não ocupa muito espaço. E ainda assim cumpri constrangidamente nosso percurso de cerca de 20 minutos. Recebemos muitos olhares de reprovação e muitos comentários ao redor, em maior ou menor tom de voz, sobre o fato de estarmos usando um ônibus "comum".

Eu, sinceramente, não sei se sinto mais tristeza ou revolta.
Não preciso escutar esse tipo de coisa, muito menos meu filho. Não merecemos olhares reprovadores por estar simplesmente fazendo aquilo que nos está destinado: viver à nosso modo. Meu filho é uma criança, é um cidadão. Mas parece que a deficiência tira dele, aos olhos da sociedade, os direitos advindos das duas primeiras condições. Não temos que justificar nossa existência!

Fiquei quieta, porque também não preciso ficar batendo boca em coletivo. Mas dói. Ainda assim, o problema maior é de quem se sente incomodado. Não vou pedir licença para incluir meu Caio em todos os espaços que ele tem direito - como criança, como ser humano, como cadeirante. E sei que ele ainda vai superar muita barreiras, vai ser muito feliz - faço questão de ensinar isto à ele. Só que é lamentável e, no mínimo, para se refletir... de tudo o que se fala sobre acessibilidade e como melhorá-la e praticá-la em larga escala, o maior de todos os obstáculos para que ela aconteça está dentro de cada um de nós: é a intolerância às diferenças.

5 comentários:

disse...

O melhor jeito de lutar é mesmo não privar o Caio de conhecer o mundo e viver sua vidinha. Esbarrando no preconceito dos outros ora aqui, ora ali. Mas também mudando a visão de mundo de muita gente tenho certeza! Parabéns por ser assim. Bjão

Anônimo disse...

dá quase vontade de desejar àqueles que não conseguem se colocar no lugar do outro, que passem pela mesma situação...
respeito e educação pelo outro, não importando quem é o outro. sempre.
lamento que vc tenha que passar por isso. e desejo-te forças para continuar enfrentando tudo! parabéns pelas suas atitudes. abraços
vale.

Laís disse...

Oi, Dinha!

Faço Pedagogia e no semestre passado tive a disciplina Educação e Inclusão e essa me revelou preconceitos q eu naum imaginava ter.

Infelizmente, assim como o preconceito etnico-racial, o preconceito aos portadores de necessidades especiais é algo construido historicamente, está lá nas bases da nossa sociedade. Tem um artigo muito bom da minha professora que vem falando sobre isso, qualquer coisa me passa teu e-mail que te mando. Enfim, como é algo de muiiito, muuito tempo, se torna mais dificil de se desfazer. Hoje, olhamos um deficiente ou como um coitado - q sofre juito por sua condição, um ser digfno de pena -, ou como um herói por ele fazer coisas normais que aos nossos olhos são coisas de outro mundo para um deficiente.

Não entendemos a deficiencia como algo que é do ser humano e que pode acontecer a qualquer um de nós, de várias formas. Não entendemos que não são os deficientes que devem se adaptar ao 'nosso' mundo, mas que somos nós quem devemos possibilitar que todos, em suas diferenças, tenham a acessibilidade assegurada.

A passos pequenos, mas firmes e continuos, nós chegaremos lá. Continue assim, essa mamãe tão maravilhosa e consciente dos direitos dos seus filhos.

Bjão!

Maira disse...

Me revoltei com esse post, não consigo imaginar como as pessoas podem ser tão mesquinhas, pequenas, que tipo de pessoas são essas que se sentem incomodados com um cadeirante em um ônibus que não é adaptado.
Amiga não se sinta constrangida, vc. e o lindo Caio tem todooooooo o direito de viver, de ir e vir.
Sabe tenho dó....dó dessas pessoas, eles tem muito o que aprender ainda nessa vida.
Bjs. e fiquem com Deus.

Karla disse...

Esse post é triste porque é a realidade, existe sim, milhares de pessoas que só pensam em si, nunca imaginam que talvez pudesse ser o filho, neto, sobrinho, amigo delas... só sabem olhar e criticar... é revoltante mas vc fez o certo. Ontem no Centro Espírita abrimos o evangelho na parte sobre dar a outra face. Melhor ficar calada mesmo, um dia essas pessoas aprenderão. (talvez da pior forma)

Um dia, ao falar pra uma pessoa que meu mano frequentava a APAE (tenho orgulho dessa instituição) escutei "meu filho não é menino de APAE". Me deu vontade de falar muita coisa porque o preconceito é tão grande que ela prefere deixar o filho enjaulado em casa do juntá-lo as pessoas especiais. Tem vergonha do filho, tem preconceito com o próprio filho. É triste...

Você é uma mãe especial por ter o Caio. Eu sou uma irmã especial por ter o Lu e digo... são muitas dificuldades mas aprendemos a valorizar a mínima evolução, aplaudimos um encontro de olhar, um som balbuciado e etc... só eles poderiam nos dar essas alegrias! Beijos emocionados!