sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Yuri e os 2 Caios

Às vezes eu sofro pelo Yuri. Por achar que ele criou uma expectativa com a chegada de um irmão que não se cumpriu. Que ele sonhou em ensinar a jogar bola e a dançar, um irmão que ainda não sabe sequer andar. O Yuri é um menino muito doce, de fácil relacionamento com outras crianças, especialmente as mais novas. Por isso, me dói pensar que, de algum modo, ele se sinta decepcionado com a condição do Caio. Sei que ele ama muito o irmão. E não é somente porque ele reforça repetidamente este sentimento com atitudes e palavras. Mas vejo em cada olhar que o Yuri dirige ao Caio. Na vibração por cada nova sílaba, por cada novo gesto que o Caio demonstra que aprendeu.

Quando eu convidei um dos casais de padrinhos do Caio para virem a batizá-lo, meus queridos Aline e Alessandro, eles prontamente aceitaram. E me contaram que Caio é nome de meninos fortes. Que eles tinham um casal de amigos com um filho, também chamado Caio. Um menino que superava, dia-a-dia, os obstáculos impostos pela paralisia cerebral. Com pais que lutavam incansavelmente junto àquele corajoso menino.

Há cerca de duas semanas, tive finalmente a oportunidade de conhecer este “outro” Caio. Na festa de aniversário da filhinha dos meus compadres. O Yuri se apaixonou imediatamente pelo menino! Veio me contar animadamente, que estava ajudando e ao mesmo tempo brincando, “com um menino com dificuldades”. Senti orgulho e fiquei feliz pelo Yuri. Orgulho porque ele não cansa de demonstrar, do alto dos seus 8 anos, que aprendeu a lidar com as diferenças aparentes. Com naturalidade e espontaneidade. Com solidariedade e igualdade. E fiquei feliz, porque ele e Caio brincaram muito durante toda a festa. No final, se abraçavam como velhos amigos. E o Yuri me reforçava – “Quero ver ele de novo, quero brincar mais vezes com ele. Somos amigos agora!”.

Olhava os dois e foi difícil conter a emoção ao vê-los juntos na cama elástica, atravessando o túnel, lutando com espadas de balões. Entendi que o Yuri via no amigo Caio uma possibilidade maior para o irmão Caio. De que ele pode ir além sim. E interagir mais, brincar mais, ser ainda mais feliz. Caio, hoje com 9 anos, é um criança “normal”. Com diferenças aparentes, mas inserido na escola, em festas, entre amigos. Como afinal é a própria sociedade: formada por indivíduos diferentes entre si. Obviamente não foi um caminho fácil, me confirmou a mãe do Caio. Mas é um caminho possível e recompensador.

Olhando Yuri e Caio brincando, eu tive certeza que sim. E que não preciso sofrer pelo Yuri, mas ficar feliz pelo irmão que ele e Caio são um para o outro. E ainda, como bem me avisaram a Aline e o Alessandro, todo Caio é guerreiro!



Yuri e seu novo amigão, Caio!

Olha aí a alegria dele com seus dois Caios!

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Tirando o pó

Pra quem não sabe o motivo do "sumiço": estive 10 dias de férias inesperadas, dadas por meu chefe, para resolver os problemas de saúde do Caio.

Vejam bem, 10 dias de férias para quem tem marido, dois filhos e não tem empregada nem grana sobrando, são 10 dias de trabalho diferenciado. Mas eu curti.

Claro que teve o fator motivador das férias - o Caio.

Ele tem tido vômitos freqüentes. Então, nesses 10 dias, fomos em 4 médicos e fizemos dois exames. Ele tem/está com glaucoma, refluxo e esofagite.

Mas tudo bem, alguns momentos de semi-surto e a gente segue em frente. TUDO VAI DAR CERTO!

Deu pra cochilar grudada ao Caio no meio da tarde, preparar o lanche do Yuri para a escola, criar uma balsa de sucata, cantar "a roda do ônibus roda roda" até enjoar (e enjoei mesmo), fazer negrinho e comer na panela (o do Caio era de leite de condensado de soja)...

Até deu uma certa saudade de poder fazer isso todos os dias. Mas sei bem que lá pelo 60º dia eu já estaria clamando outras atividades. Mas é justamente essa quebra daquilo que é rotineiro que fazem as férias se tornarem tão gostosas...

Agora delícia maior são essas carinhas aí de baixo... Não concordam?

Cara sapeca, mas pra mim, sempre linda


O sorriso e a alegria que tanto amo e admiro!

Alguém já provou pirulito mais gostoso?

Rosto pintado de criança, pose irreverente de "pré-adolescente" (ai, meus sais!)


O militar mais lindo da Base Aérea de Canoas!

Fazendo pose... Ele se acha, né? (E eu tenho certeza - hehehe....)

terça-feira, 14 de outubro de 2008

O maior tesouro

Eu quero apenas olhar os campos,
Eu quero apenas cantar meu canto,
Eu só não quero cantar sozinho,
Eu quero um coro de passarinho,
Quero levar o meu canto amigo,
A qualquer amigo que precisar.

Eu quero ter um milhão de amigos
E bem mais forte poder cantar
Eu quero ter um milhão de amigos
E bem mais forte poder cantar

Eu quero apenas um vento forte,
Levar meu barco no rumo norte
E no caminho o que eu pescar
Quero dividir quando lá chegar
Quero levar o meu canto amigo
A qualquer amigo que precisar

Eu quero crer na paz do futuro,
Eu quero ter um quintal sem muro
Quero meu filho pisando firme,
Cantando alto, sorrindo livre
Quero levar o meu canto amigo
A qualquer amigo que precisar

Eu quero amor decidindo a vida,
Sentir a força da mão amiga
O meu irmão com sorriso aberto,
Se ele chorar quero estar por perto
Quero levar o meu canto amigo
A qualquer amigo que precisar

Venha comigo olhar os campos,
Cante comigo também meu canto
Eu só não quero cantar sozinho,
Eu quero um coro de passarinhos
Quero levar o meu canto amigo
A qualquer amigo que precisar

(Roberto Carlos - Eu quero apenas)

----

Nenê, Anísia, Edson, Jana, Ana, Nalu, Dê, Dani S, Márcia, Bibi, Isa, Lê, Alê, Angélica, Babi, Tati, Marcinha, Greice, Dê RJ... quem tem amigos como vocês tem muito mais que um milhão deles!
Não me canso de repetir: por mais que eu me esforce, numa poderei retribuir à altura todo o bem que vocês nos fazem. Deus os abençoe!

Saldo do Dia da Criança

Ito fazendo folia na sua piscina de bolinhas!

Yuri em pose de galã com os presentes mais desejados!

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

O Dia das Crianças - Expectativas

Algumas datas me deixam mais sensível.
O Dia das Crianças acaba sendo uma delas.
Primeiro, porque o Caio não recebe brinquedos na mesma proporção que o Yuri, por ainda existem pessoas de nosso convívio que acham que "não adianta".
Depois, porque até na busca de presentes para meu caçula, encontro barreiras.
Me dói olhar as vitrines repletas de bicicletas, de carrinhos e outros tantos que ele não consegue usar. E nem saberemos se um dia ele poderá usar.
Me chateia que ele ainda não faça sua lista de pedidos, como o Yuri fazia (e ainda faz).
Eu decido por ele, escolho o que acho mais adequado.
Neste ano, em especial, me apaixonei por um robôzinho.
Além de não estar dentro das minhas po$$es, meu Caio não consegue conduzi-lo. E este "não conseguir" ainda me dói.
Mas compramos, por indicação de suas terapeutas, uma piscina de bolinhas.
Será útil e divertido ao mesmo tempo.
E quem sabe ainda dê tempo dele vir a conduzir o robôzinho sonhado?

P.S. Yuri, sempre generoso, fez sua lista de presentes...

"Para o Yuri:
- camisa do Manchester United
- luva de goleiro
- pista do Pântano
- bola de futebol oficial

Para o Caio:
- boneco do Júlio
- brinquedo Fisher & Price pra ele aprender algo
- um carrinho
- bastante leite de soja"

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Existe um culpado?

Recentemente lhes apresentei aqui a fonoaudióloga Rosana, um novo anjo para o Caio e todos nós. Temos aprendido muito com ela, com sua experiência profissional e como mãe também. A filha dela, de 1 ano e meio, tem um quadro neurológico muito parecido com o do Caio, com uso das mesmas medicações, indicação das mesmas terapias. E ela também tem desabafado conosco, sobre a difícil, e minha conhecida, tarefa de conciliar carreira (nos nossos casos necessária) e a maternidade de uma criança com necessidades especiais. Ela trabalha três vezes na semana e tenta conciliar os cuidados com a filha. A mãe dela cuida na menina nos demais dias, mas, segundo a Rosana, não a estimula o necessário, deixa ela dormir demais e tal.

Para quem ainda não sabe (?), a paralisia cerebral do Caio é decorrente de falta de oxigenação no parto, adiado por uma errôena decisão médica de adiar uma cesárea por 5 dias. Caio acabou nascendo de parto normal, mas as infecções subseqüentes lhe deixaram o cérebro bastante lesionado. Levei quase dois anos para decidir ir atrás do que acredito serem nossos direitos. E um dos fortes motivos na demora da minha decisão é a minha crença pessoal de que cada um escolhe sua missão. Caio não tem paralisia cerebral e não é meu filho por mero acaso ou acidente. Já estava escrito e tanto eu quanto ele, assinamos embaixo.

Mas um dia desses me sensibilizei muito com um desabafo da Rosana, de que nós temos a quem culpar. "Vocês colocam a culpa do Caio ter deficiência no hospital e no atendimento que receberam. Mas e eu? Minha filha nasceu com má formação. Culpo quem?".

Foi esse questionamento, de busca por culpados que me fizeram emperrar muitas vezes. Reitero tantas vezes que o Deus no qual acredito não impõe nada. Não castiga. Não culpa. Mas então, todos os envolvidos comigo e com o Caio escolheram fazer parte dessa história. E eu me perguntei se, ao buscar a justiça dos homens, eu estivesse renegando aquilo que nos foi destinado. Mas, conversando com um iluminado amigo, ele pôde me esclarecer. O mesmo Deus que não impõe, nos dá o livre arbítrio. E se afinal estamos aqui para aprender, e não para uma passagem estática, escolhemos nossas lutas e como travá-las. O essencial é que o imperativo seja o amor. O resto vem como conseqüência dessa escolha maior. Inclusive e, principalmente, mudanças que possamos criar, por nossa livre vontade.

Gostaria de poder dar este alento à Rosana. Nem eu, nem o Caio, nem ela, nem sua filha, estamos sendo castigados ou temos qualquer culpa. Não fomos necessariamente pessoas más em outra encarnação, nem nada disso. Escolhemos estar perto dessas crianças, dessas vidas tão especiais, tão iluminadas. E só posso assegurar que por mais que às vezes seja dolorido, é também uma benção incomensurável.