quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Epilepsia, o meu bicho-papão

Então que aconteceu de novo.
Caio teve uma nova crise convulsiva ontem à tarde, após uma crise de refluxo gastroesofágico, o que atrasou toda sua medicação em mais ou menos 6 horas.

Eu costumo dizer que não há crise branda para um coração de mãe. Não é nada fácil ver um filho convulsionando, tremendo sem controle, babando, ficando anóxico. Caio ontem não ficou anóxico (roxinho), saturava bem apesar da crise. Então, acabo colocando suas crises em escalas. A de ontem foi "mediana". Durou uns 10 minutos e só cessou após a chegada do socorro médico e da aplicação de Diazepan na veia. Mas cessou mui brevemente (menos de um minuto) e colocaram suporte de oxigênio por insistência da médica, mas ele sua saturação em crise não baixou dos 93%. De qualquer forma, eu sofro e sofro muito.

O neuropediatra dele insiste que não podemos deixá-lo tendo crises com essa frequência atual - média de uma a cada dois meses. Pergunto à ele quais os riscos. Novas lesões cerebrais e consequente atraso ou comprometimento maiores em seu desenvolvimento, me diz. A literatura médica afirma que, a cada crise convulsiva, morrem neurônios. A solução?, pergunto novamente. Associar um quarto anticonvulsivo aos três que ele já toma. Com a direta consequência dele ficar dopado a maior parte do tempo. As crises, muito provavelmente, cessariam. Pra mim, isso não é solução. Já escrevi sobre isso antes, aqui.


Quando conheci o atual neurologista do Caio, ele me perguntou porque eu estava tão descontrolada ao ver meu filho convulsionando, visto que ele tem síndrome de west. Hein???? Não entendi nada. O Richard foi o primeiro a me "botar as cartas na mesa" e me explicar o que era o temido traçado eletroencefalográfico com hisparritmia que o Caio apresentava desde os 6 meses e que tanto assustava os demais médicos, que apenas me diziam: "é grave". Me explicou que Caio tem uma desordem nas descargas elétricas cerebrais e que, por isso, ele vai convulsionar sempre. West é um tipo de epliepsia muito forte, algumas crianças com várias crises diárias! E eu não poderia ficar histérica cada vez que o Caio tivesse uma crise. Eu tinha que saber enfrentá-la, ajudá-lo.

Sempre vou agradecer a honestidade e clareza com que o médico me colocou essas coisas. Foi libertador. Óbvio que não gosto de ver o Caio em crise convulsiva. Mas saber que faz parte, que é nossa condição, me mune de mais discernimento para lidar com ela no dia a dia.

Então, agora, não entendo esse tratamento onde dopar é a saída. Saída pela janela, cara pálida! Estou tentando uma segunda opinião médica pelo convênio, mas tá difícil! Quero refazer tomo e eletro do Caio. Porque na prática, mesmo ele tendo essas crises contínuas, ele acorda normal, como se nada tivesse acontecido. Ainda ontem, abriu os olhos, olhou ao redor, me esticou o bracinho e me mandou um beijo fraquinho, mas tão cheio de amor! Não vemos perda neuronal! Eu não vejo, os profissionais que o acompanham na reabilitação não vêem... O neuropediatra me diz que ter ficado um ano inteiro sem crises, como nos aconteceu dos meados de 2010 para cá, foi a exceção da regra. Não costuma acontecer. Médicos não costumam usar a palavra milagre. Eu acredito em bençãos.

Caio costuma convulsionar quando tem um foco infeccioso, febre, estresse por noites mal dormidas... enfim. Absolutamente normal para uma criança com seu quadro. Só que me questiono zilhões de vezes ao dia se essa minha postura afinal, de ver a epilepsia como nossa condição normal, está certa. Porque realmente não quero dopar meu filho. Para mim, seria como perder a guerra e perdê-lo para a vida. Caio mostra respostas, evoluções e comportamentos que nunca foram acreditados para uma criança com paralisia cerebral e síndrome de west. E eu sigo querendo acreditar que a medicina não é uma ciência exata. Cada indivíduo é único, sua forma de reação à uma doença ou tratamento também pode ser único.

Nisso tudo, só fica meu pavor de estar escolhendo errado. Caio não tem autonomia, eu decido por ele. E, por enquanto, tenho decidido que vamos enfrentar a epilepsia como tem sido: pronto atendimento, diazepan, monitoramento da oxigenação, repouso e bola pra frente!

Me pergunto o tempo todo se ele sofre com as convulsões, se tem dor. Ou se como poéticamente quero acreditar e me é aparente, ele dá conta.
Dizem que 7 anos costuma ser uma idade decisiva para crianças com West. Eu queria mesmo é que a síndrome nos desse tchau, fosse embora levando a epilepsia junto. Mas sei que isso é incerto.
A certeza que tenho é que quero meu filho inteiro para a vida, descobrindo e sentindo cada experiência. As boas e as más. Mas inteiro. Estou querendo muito?

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Meu pai e eu, the never ending story...

Já escrevi algumas vezes aqui sobre meu pai... Acabei me dando conta de que há até um marcador aqui no blog só pra ele. Sinal de que ele é importante na minha história. Como acredito que é ou deve ser todo pai, toda mãe. Pena que a nossa história é de uma complicação sem fim...

Tentando resumir: meu pai separou da minha mãe quando eu tinha mal 5 anos. Ele era alcóolatra, violento, batia muuuito nela. Não a deixava trabalhar fora, mas também não provia a casa como devia, por conta do seu vício. Até aí eu entendo tudo. Mas não consigo aceitar o fato de que, após separação, meu pai nunca mais procurou a mim e meu irmão. Eu, como tinha lembranças claras das surras que ele dava na minha mãe, não sentia tanto sua falta. Mas meu irmão, que mal chegou a conhecê-lo, muito chorou e pediu pra ver nosso pai. Minha mãe não permitia e meu pai não nos procurava. Sabem quando aconteceu o reencontro entre pai e filho? 25 anos depois, no enterro do meu irmão!

Eu acho que esse pode ser um dos motivos que eu não me permito evoluir minha relação com meu pai. Me dói pensar que meu irmão quis tanto ter um pai, ou ao menos conhecer o seu e não conseguiu. Às vezes penso ser injusto que eu desfrute da companhia dele, visto que essa tentativa de aproximação só aconteceu pela morte do meu irmão.

Mas não é um motivo isolado. Falo - e sinto - que meu pai para mim é um estranho, do qual tenho má impressão. Não conheço este homem e ele não me conhece. Tentamos algumas vezes, mas sempre me foi dolorido. Meu pai não tem traquejo, por assim dizer. Na primeira vez que me viu, comentou sobre o quanto eu era magrinha quando criança e como tinha ficado tão gorda. Numa outra visita, me lembrou que devia ficar de olho no Yuri para ele não seguir meu caminho (no quesito forma física). Ok, até entendo. Não me orgulho do meu corpo. Não desejo que Yuri siga pelo mesmo caminho. Mas com 25 anos de brecha na relação pai e filha, acho que teríamos coisas mais importantes ou significativas para conversar. Depois do nascimento do Caio, ele volta e meia me telefonava perguntando quando ele iria ficar curado, quais são os prognósticos médicos... E na boa, não aguento esse tipo de cobrança! Me canso de explicar que paralisia cerebral não se cura!

No nosso último contato, ele chorou. Disse que eu era muito fria. Que esperava ouvir de mim um "eu te amo, meu pai". Oi? Já tenho uma vida toda empepinada, não preciso mais uma pessoa na minha vida pra me cobrar beleza física, cuidados com um filho, a reabilitação plena de outro e declarações de uma filha amorosa! Me poupe, mas, na minha concepção, quem me deve é ele!

Nunca mais atendi seus telefonemas.
E lá se foi mais de ano... Mas o ruim é que não me sinto bem com isso.
Penso nele. Penso, como já escrevi por aqui, no único avô que meus meninos têm e não convivem, não conhecem.
Entendo a doença do alcoolismo, já superada.
Entendo a separação com minha mãe e sei hoje que ela também fez sua parte para que ele não nos procurasse.
Às vezes até penso que ele pode ter danos neurológicos pelos anos de bebida...

Nas reaproximações anteriores, imaginei que eu poderia ir desarmada, sem criar expectativas.
Mas não adianta.
Eu sou a filha. Eu fui "abandonada". Eu quero colo.
E aí acho que nossa relação tem tudo pra dar errado.
Porque ambos queremos a mesma atenção. Eu e ele queremos receber, antes de doar.

Ultimamente tenho pensado bastante nele outra vez.
De que está velho, talvez no fim da sua jornada.
Da paz que talvez eu alcançasse se pudesse perdoá-lo e viver, algum tempo, uma relação minimamente sadia.
Se tem assunto mal resolvido (ou não resolvido) na minha vida, este assunto é meu pai.
E isso me dói.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Pertencendo a lugar nenhum

As matrículas e rematrículas escolares estão a todo vapor aqui em Canoas.
Para quem estuda nas escolas municipais - como o Caio - a rematrícula garante a vaga no ano seguinte. As vagas que são disponibilizadas pela saída dos alunos para outras escolas, outros níveis de ensino, são distribuídas através de sorteio público, visto que são vagas bem concorridas. A vaga do Caio especificamente foi conseguida após sorteio com base na lei que prioriza seu ingresso na rede de ensino.
Lembro ainda do quanto fiquei feliz quando ele foi finalmente chamado para ingressar na escola. O quanto estamos sendo felizes neste quesito - inclusão, estímulo, sociabilização, aprendizado - ao longo dos 5 meses que Caio tem frequentado o jardim.

Mas, para mim parece claro que suas limitações especialmente físicas lhe impõem outro ritmo de desenvolvimento. A professora e monitora que o acompanham falam que o desenvolvimento dele é visível (e sim, eu vejo!). Mas que ele precisaria de mais um tempo na educação infantil, explorar melhor certas experiências sensoriais, lúdicas, antes de ingressar no ensino fundamental. Comentei aqui. A Secretaria de Educação indica que ele precisa ir para a primeira série, o que implicaria em trocar de escola, visto que já tem 6 anos completos. E isso me angustia, pois se os professores e demais profissionais acham prematuro para ele, eu acato, acredito. Alguns estudiosos são contra o ingresso no ensino fundamental com 6 anos inclusive para as crianças sem deficiência. Pois a SME quer que ele vá para a primeira série. Se for indicado que ele não tem condições de frequentá-la, deve ser encaminhado à uma escola especial.

Neste momento sofro por ver que, para grande parcela da sociedade, meu filho não pertence a lugar algum. Não tem um laudo definitivo de deficiência mental que o possibilitasse ser aceito numa escola de educação especial - onde, inclusive ele foi rejeitado no início deste ano, antes de ingressar em sua atual escola. Mas suas limitações físicas são barreira para a maioria das pessoas concebê-lo no ensino regular. E infelizmente, essa situação, de exclusão, de ser exceção onde nenhuma regra se aplica não se limita à escola...

Penso que luta gigante ainda teremos pela frente.
Tento imaginar como a batalha sem fim que foi para Flávia e sua família. Provar que por trás daquele corpo aparentemente inoperante havia um cérebro que entendia, absorvia conhecimentos e era capaz - com os devidos suportes - a dar as devidas respostas.

O cognitivo do Caio ainda é uma incógnita.
Ele alterna momentos de rápida resposta e interação com outros de aparente ausência.
Nenhum dos profissionais que o acompanham querem estabelecer ainda um atestado de comprometimento mental. Dizem que ele necessita ficar mais tempo exposto a mais estímulos para que possamos ver até onde ele consegue ir. E ele está indo bem.

É óbvio que ele tem atraso no desenvolvimento neuropsicomotor. Mas isso não quer dizer que ele é incapaz de aprender, de acompanhar. E sofro pensar que ele possa a ser impedido de mostrar sua potencial capacidade.

De qualquer forma, com ajuda e orientação de amigos, consegui reunir laudos de pediatra, fonoaudióloga e terapeuta ocupacional que o acompanham, recomendando a permanência na educação infantil por mais um ano. Fiz uma solicitação de próprio punho, baseando meu requerimento no direito à temporalidade flexível do ano letivo que crianças portadoras de deficiência têm. Suas professoras fizeram um parecer. Amanhã entramos com a solicitação oficial na SME pela permanência do Caio. Espero que seja apreciado com brevidade ou minha ansiedade vai me consumir. A diretora me garante que, por enquanto, a vaga do Caio fica para ele mesmo, não é disponibilizada até que a Secretaria se pronuncie.

Cainho, Cainho, às vezes fico surpresa da quantidade de habilidades que tu colocas, diariamente, no colo da mamãe aqui... Mas se tem algo que aprendi contigo, meu filhote, é a não desistir. Vamos lutando sempre. Como dá, com as armas que temos... E com aquela fé teimosa, que tu me ensino há mais de 6 anos... Deus há de nos reservar o melhor. Acreditemos e aguardemos.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

O dia da criança por aqui, foi assim...

Caio fez sua estreia na Expoaer, na Base Aérea de Canoas, em meio à maior muvuca.
Assistiu e adorou o show da Esquadrilha da Fumaça, tirou foto perto de vários aviões, ganhou uma camiseta de oficial da FAB e, no final, um folder todo autografado pelos pilotos da Esquadrilha! Show!











Yuri ganhou a permissão de furar a orelha e usar seu tão sonhado brinco.
Gostar, eu não gostei. Mas permiti, porque entendo a onda do momento.
Ele não foi na Expoaer porque tinha um aníver regado à futebol (proposta sempre irrecusável pra ele).


Apesar da sensação, cada vez mais frequente, de só ter UMA criança em casa, ainda tá valendo.
E foi um dia bacana.
Caio, dá pra ver, curtiu horrores. E aí, alegria de filho é nossa felicidade.

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Depressão

Há pouco mais de um ano minha vida entrou no olho de um furacão.
Às vezes, parece que saí dele... Em outras, me vejo girando velozmente sem ter a mínima ideia de onde vou parar.
As coisas pareciam ter entrado nos eixos, embora os eixos que eu conhecia e pelos quais me guiava, definitivamente, tenham mudado de lugar.
Nos últimos meses eu só tive uma certeza: a de que nada é para sempre. Nem a tempestade. Muito menos a calmaria.

A primeira vez que me dei conta que eu podia ter depressão foi no final de 2006. Eu sentia uma infelicidade por tudo. Chorava copiosamente. Queria dormir o dia inteiro. E, embora não o fizesse, varava as noites em larga insônia. Mas, como tudo na minha vida, eu me culpava. Me culpava por estrar deprimida. Me sentia fraca de caráter por isso. Será que a vida não podia sair um pouquinho do seu eixo que eu já tinha vontade de desistir de tudo? Na época encontrei um médico maravilhoso que me explicou muito sobre a depressão. Principalmente que ela é uma doença. Não tem nada a ver com caráter. Mas que tem tratamento. E tê-lo ao alcance era uma benção.

Comecei a tomar remédios e fazer terapia.
E por um par de anos, foi meu esteio.

Eu às vezes acho que eu sou a minha maior sabotadora. Porque parei de fazer terapia e comecei a fazer terapia reencarnacionista. Abre parênteses: não estou criticando nenhuma das duas opções. Mas eu queria algo mais "natural". Sim, eu era cheia de preconceitos. Eu não queria ser "louca". Eu não queria me "chapar" - e eu tomava uma dose bem levinha - com antidepressivos e ansiolíticos. Eu queria enfrentar o meu mundo, as minhas dores particulares de cara limpa.

Acho que não deu muito certo.
Especialmente ao longo de 2010 fui me perdendo de mim mesma.
E hoje, confesso, me vejo frustrada e infeliz a maior parte do tempo.
Mas eu ainda me questiono e me culpo.

Me pergunto porque sou assim... depressiva...
Eu acho, acho mesmo que tenho garra, que sou valente.
Então, por que me entrego ao mimimi, à auto-piedade?
Porque sim, hoje, depois de muita terapia, eu assumo: ainda acho que o mundo me deve. Que eu merecia que a vida me fosse melhor, mais fácil, mais florida.

E, por favor, não venham fazer relação dos meus sentimentos com a deficiência do meu filho. Isso é parte integrante da minha concepção frente a tudo que minha vida se transformou ao longo dos meus 39 anos. E, sem sombra de ser demagoga, Caio me trouxe muito mais perspectiva. Às vezes acho que, se não fosse por ele, eu já tinha desistido de tudo mesmo.

Recentemente me vi no fundo do poço por uns dias.
Vontade zero pra vida.
Mas aí eu junto cada pedacinho que acho que ainda tenho de coisas boas e volto outra vez. Mas não queria que fosse assim. Acho que só o bate-papo da terapia não tem adiantado. Acho que vou precisar voltar pra minha tarja preta.

Eu estou em desalinho.
Acho que cresci muito. Mas ainda tem um tantão pela frente me esperando.
E eu quero dar conta.