segunda-feira, 10 de março de 2014

Normal é nascer com saúde

Assim: estou cansada. Cansada não, exausta desse mundo onde todos têm que concordar com todos e, principalmente, todos têm que concordar em ser politicamente corretos, naturalistas, despojados, etc. Há muito penso em compartilhar minha opinião, mas não o faço porque o cansaço é enorme. Mas aí resgato o porquê criei o Meus Frutos. Não foi para agradar ninguém. Não foi para ter "fãs" (pretensão de todos que estão no mundo conectado dos dias de hoje), nem seguidores, nem nada do gênero. Sou extremamente grata a todos os vínculos criados a partir do blog, as experiências trocadas. Mas ele é meu. Assim como a opinião - e no meu caso, a dor - também são minhas. 

Somente num espaço de menos de sete dias, as redes sociais são bombardeadas de postagens e comentários sobre o fato de Ana Hickmann ter feito cesárea, contrapondo com a esposa de Márcio Garcia que teve um filho prematuro de parto normal. As ativistas do PN bradam quase em tom de deboche de Ana - "quer ver como vão dar a desculpa de que ele não teve dilatação?". E glorificam a opinião de Márcio, que enaltece o PN suprimindo de suas reproduções de texto a parte em que ele diz que a cesárea às vezes pode salvar vidas.

Eu sempre idealizei um parto normal. Vim ao mundo através de um, minha mãe falava maravilhas dele. Quatro anos depois ela precisou - sim, precisou mesmo - fazer uma cesárea para meu irmão vir ao mundo, cirurgia da qual ela teve complicações por muitos e muitos anos. Então, eu queria pra mim o mesmo parto que me fez nascer... Mas não foi possível. Nas últimas consultas de pré-natal a médica me alertou: teu colo de útero está muito duro, não há nenhum sinal de dilatação. Vamos aguardar, mas o parto normal não está me parecendo muito viável. No dia em que Yuri quis vir ao mundo, foi o rompimento da bolsa que me avisou disto. Nenhuma dor, nenhuma contração, zero dilatação. Fui para a maternidade ainda sonhando em poder parir meu filho naturalmente. Foram cerca de 12h de espera, aplicação de ocitocina e... zero dilatação. Yuri veio ao mundo por uma cesárea. Lindo, corado, tranquilo.

Com Caio, a história se repetiu. Com um porém: ele era prematuro - como o bebê de Márcio Garcia. Com bolsa rota e prematuro, os médicos se negaram a realizar a cesárea. Foram 5 angustiantes dias de espera. Por um parto que veio "normal". Normal não, vaginal. Nasceu cianótico, não chorou. Decretaram em sua declaração de nascido vivo: criança de cor negra! Foi levado imediatamente para a UTI onde permaneceu por 55 dias.

Para as defensoras intransigentes do PN, eu aviso: nem sempre ele é possível! Sim, é verdade, não é conto da carochinha, algumas mulheres não têm dilatação suficiente! E aí eu pergunto, sobre parto humanizado. O que foi mais "humano"? Yuri nascer de cesárea, vir imediatamente para o meu peito, receber meu amor, minha emoção... depois dos procedimentos de higiene e medição voltou para meu colo e de lá não saiu mais até irmos para casa... com quem pude exercer a amamentação plena? Ou Caio, que nasceu de parto vaginal, em sofrimento, o que lhe ocasionou danos cerebrais permanentes... que foi ficar sozinho, sendo picado por infinitas agulhas na ala de isolamento de uma UTI... a quem só pude segurar no colo com 13 dias de vida e a quem não pude oferecer meu peito por suas complicações de nascimento? Qual parto foi humanizado? Yuri cresceu sempre um bebê extremamente sadio fisicamente e seguro de suas emoções. Caio tem sequelas que o acompanharão por toda a vida e até hoje, aos quase 9 anos, tem traumas decorrentes da longa internação hospitalar. Será que o método cirúrgico foi danoso ao desenvolvimento de Yuri? E no quê o parto normal contribuiu para o bem estar do Caio?

Eu não levanto a bandeira da cesárea. De jeito nenhum. Só acho que cada um tem que fazer o que lhe der vontade, sem necessidade de se justificar ao mundo - sejam celebridades ou não - fazer o que achar melhor para a sua vida e que ninguém tem que pitacar ou tripudiar a respeito.

Eu faria mil cesáreas se soubesse que ela livraria Caio da paralisia cerebral. Mil. E nunca fui menos mãe, menos mulher, menos fêmea por ter parido Yuri num ato cirúrgico. Para mim, não houve essa distinção. O nascimento de meus dois filhos foi o coroamento de um amor que vivi, foram frutos dele e bençãos de Deus reafirmadas no milagre da vida acontecendo a partir de mim. Nunca me senti tão poderosa! Mas reafirmo: eu trocaria sim, a sensação linda de ter sentido Caio sair de dentro do meu corpo - o que não aconteceu com Yuri, claro - pela sensação maravilhosa de ter um filho perfeito (e aí, claro, me refiro a seu corpo, porque sei quão grandiosa é a alma dele) todos os dias.

Normal é nascer com saúde.
Normal é crescer sendo amado.
Normal é ser respeitado como vida antes sequer de abrir os olhos ao mundo.
Todo o resto é supérfluo.

Não quero com este desabafo - se alguém vier a ler e se sentir incomodada - comprar brigas. Quero compartilhar reflexão. Defendam suas bandeiras. Mas sem deboche, sem agressividade, sem julgamentos. Divulguem suas ideias, mas deixem claro que nem sempre é possível. E que a humanização não tem relação com a cirurgia em si, mas com todo o atendimento prestado à parturiente, ao bebê, à família. 

Porque a dor que carrego comigo, de ter certeza - já comprovado médica e judicialmente - de que uma cesárea poderia ter escrito uma história bem mais leve, simples e feliz para mim e Caio, esta sim, é uma cicatriz que jamais se apagará. Está na alma.