segunda-feira, 22 de outubro de 2012

O grande mal

Semana passada Caio teve uma nova crise convulsiva. Foi a primeira não-febril após a troca das medicações de uso contínuo, há quase quatro meses. Esta é a boa notícia: fora o episódio da pneumonia, foram quase 120 dias sem crise. E é este lado, o do positivo, que eu quero enxergar. 

Sempre olho pra trás e vejo que nossa jornada não foi fácil. Chegar até aqui, 7 anos depois, e aceitar com naturalidade que tenho um filho deficiente por conta de um erro médico e que nossa vida será para sempre "diferente", mas que pode e deve ser feliz, bem humorada e, ao mesmo tempo, igual ao de qualquer criança é uma batalha constante. Porque existem os dias em que é até mesmo preciso fraquejar - e eu aprendi recentemente que posso me dar este direito. E como já compartilhei aqui, aceito que talvez ele nunca ande, talvez nunca fale de maneira que o entendam bem, talvez ele nunca corresponda às expectativas que a sociedade costuma fazer, buscando uma cura que não existe para a paralisia cerebral. O que não quer dizer que eu não busque incessantemente reabilitação, avanços, qualidade de vida... mas não porque a sociedade ou a família assim esperam. Faço porque quero todos os dias dar motivos dele exibir o sorriso lindo e largo que só ele sabe...

Mas a epilepsia ainda é meu fantasma. A doença que era conhecida na antiguidade como "o grande mal" é o meu "de mal com a vida". Quando as crises convulsivas clássicas iniciaram, em 2008, eu queria morrer cada vez. Até que me explicaram que ele tem uma síndrome (West) e que seria absolutamente normal convulsionar muitas e muitas vezes. E eu não poderia morrer tantas vezes assim... Fui me fortalecendo e acho que lido muito bem, especialmente nos quesitos práticos, com cada crise. Mas tenho medo delas. 

A convulsão vem quando menos imaginamos. Ela não nos prepara. E por mais que eu sei, estudos digam, que o epilético nada sente, nada lembra, fica fora do ar durante a crise, eu enxergo no meu filho um momento de sofrimento grande, onde ele não consegue ter controle nenhum sobre seu corpo e sobre as coisas mais simples, como respirar, por exemplo. Tenho a sensação que ela me rouba meu filho por um tempo.

As orientações básicas dizem que devemos deitar a pessoa com convulsão e esperar a crise passar. Com Caio não é assim. Precisamos verificar saturação, batimentos cardíacos... Normalmente ele não volta sem uso de medicação intravenosa. Algumas vezes, ele fica fraco e prostrado por um par de dias pós crise. 

Esta última não. Foi uma crise de ausência, que durou poucos minutos e ele conseguiu voltar sem uso de medicação. Ainda assim, ficou em ritmo mais lento no dia seguinte. Mas passou, ele ficou 100%. 

Quem acompanha nossa trajetória conhece a frase, conhece o desejo: "sonho tudo para o Caio". Mas se eu tivesse o direito de sonhar, de pedir uma só coisinha ao papai do céu e à medicina, eu pediria a remissão da epilepsia. Torço para que o novo tratamento, quem sabe, nos leve para este desejado caminho.

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

A segunda escola

Então que após a primeira reunião com a equipe do CEIA, que relatei aqui, as coisas continuaram andando e bem. Fui para uma reunião com o responsável pela Sala de Recursos da escola, que é o pedagogo que trabalha em horários extra-aula com crianças com déficit de aprendizagem ou dificuldades/deficiências físicas, mentais ou motoras. Gostei dele. Tem uma visão muito parecida com a minha sobre inclusão, o papel dos educadores e a deficiência em si. Ele me comentou que as meninas do CEIA, ao apresentar o quadro do Caio, citaram, claro, a síndrome convulsiva e perguntaram se ele gostaria de ter acesso a algum material a respeito do assunto. Ele foi enfático: "Não. Vou conviver com uma criança, não com uma síndrome. Se tiver algo que eu precise saber a respeito do quadro clínico, que possa ajudar no meu trabalho, aprenderei no convívio com ele e a família dele". Ganhou mil pontos comigo!

Combinamos de que o Caio começaria a ir uma vez por semana, conforme o sugerido pelo CEIA. E esta semana já fomos. O bom pressentimento que tive desde a primeira reunião, se manteve. Caio passeou com o professor Fabiano por todos os espaços da escola - salas, sala de recurso, laboratório de informática, auditório, biblioteca, secretaria, refeitório, pátio... O professor inclusive já encomendou um mouse adaptado e fones de ouvido pra Ito mexer à vontade nos computadores e curtir suas músicas preferidas. A grande maioria das pessoas foi receptiva ao Caio, conversando, sorrindo. E eu confesso - acho que tenho know-how suficiente para distinguir sorrisos naturais e sinceros, dos constrangidos... Ainda que eu tenha aprendido que o constrangimento pode vir mais da falta de informação do que de um preconceito maldoso, fico feliz de que as coisas comecem assim.

Minha alegria ficou ainda maior ao ver Caio ser recepcionado, numa das salas, por ex-coleguinhas do Jardim A, do ano passado. Que ficaram felizes em abraçá-lo e reiterar ao professor: "sou amigo dele, conheço ele", "a gente brincava junto na Vó Corina". 

Caio alternou momentos de entusiasmo com outros de estranhamento, o que acho muito natural para qualquer criança. Os encontros semanais seguirão. E eu sigo acreditando que, quem sabe, o raio pode cair duas vezes no mesmo lugar: o da inclusão pura e simples!

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Fantasmas e fraquezas


Acho que estou de mãos dadas com a depressão de novo. Às vezes penso que posso mesmo ser bipolar. As coisas têm acontecido em minha vida. Se não aconteceram no tempo em que desejei, realmente acredito que acontecem no tempo certo, quando tenho mais maturidade para entender, aceitar, aproveitar. Acho que estou colhendo os frutos de todas as decisões que semeei ao longo dos anos. E fico verdadeiramente feliz por isso.

Mas, estranhamente, ao mesmo tempo, sinto uma angústia. Um vazio. Um “falta algo”. E aí caio em tristeza profunda. Daquelas que me tira o ânimo de sair da cama. Que dá vontade de fugir. E, meu mais cruel algoz que costumo ser, me questiono e me condeno por sentimentos tão dúbios e conflitantes.

Penso se é uma característica só minha. Ou se tem relação direta com a eterna insatisfação do ser. Ou se lá no fundo eu não sou/estou tão bem resolvida como acredito e ainda acho que o destino segue em débito comigo e quero mais flores da vida.

Não se sentir feliz o tempo todo é normal, imagino eu. Mas e quando quase tudo te dá motivos pra sorrir? É à minoria negativa que me apego? Por quê? Ou estarei dando eu mais valor a tristeza do que ela realmente tem...

Alguns queridos amigos, leitores até, me acham um “exemplo”. Não sou. Sou assombrada. Tenho momentos de grande fraqueza. A única qualidade – que às vezes também prejudica – é que sou transparente em excesso. Só não o suficiente ainda para entender as motivações de cada um dos meus maluquinhos sentimentos.

E, enquanto esse dia não chega, viva a terapia e a tarja preta!