quinta-feira, 3 de setembro de 2015

Aproxima a hora da colheita

O blog existe há mais de 10 anos. Antes da gravidez inesperada de Caio, era um espaço onde eu tentava exercitar minha veia criativa de redatora, além da frustração profissional que vivia naquele momento. A partir da gestação e todas as suas particularidades desde o início – não planejada, eu e marido desempregados, a ida dele para a Europa e eu ficando aqui sozinha com Yuri com apenas 4 aninhos... e tudo o que ainda veio pela frente...
Nasceram os Meus Frutos, o cyber espaço onde eu compartilhei minha maternidade com o mundo (e não é exagero... além de amizades por todo o Brasil que se fortaleceram, saíram do virtual e perduram até hoje... Alguns amigos internacionais também vieram!). A gravidez de Caio foi, literalmente, a semente. De novas vidas – a dele e as que se transformaram após sua chegada. De um longo processo, que mal eu podia supor o tão correto nome que dei ao blog. Meus Frutos eram meus filhos. Minhas ideias. Tudo que vinha de mim... Meus Frutos, hoje percebo, são os que plantei e cultivei ao longo deste processo transformador.

A dor e o medo podem ser positivos. Quando te tiram do lugar de mera vítima e te levam para o papel de contestação. Por que eu? Por que comigo? E aí, não no sentido de vitimismo, mas de busca pela compreensão do que a vida quis dizer quando te elegeu para este destino. Ou, para o que eu acredito hoje, do entendimento de que realmente NADA é por acaso. TUDO está escrito.

Acho que fé é essencial na vida das pessoas. Às vezes, uma revolução em nossas vidas e pronto, não acreditamos em mais nada. Acho isso tão triste. Para mim, se chama desesperança. Quando meu irmão morreu, subitamente, aos 25 anos, minha mãe “brigou” com Deus. Se Ele existisse, me dizia ela, não deixaria algo assim acontecer. Quando Caio chegou, colocando tudo o que eu achava que acreditava mais o que eu pensava que estava certo no olho de um furacão, eu, intuitivamente dizia: Está tudo certo, Pai. Sei que está. Aceito. 

Óbvio que nem sempre foi assim. A notícia de que tua gravidez perfeita culminou num filho com paralisia cerebral e graves sequelas para sempre nunca é tranquila. Mas foi no desespero e na dor e dentro do que eu achava que era vitimismo, que me perguntei: Por que eu? Por que comigo? E na busca das respostas, encontrei um novo caminho.
Um caminho que me permitiu preparar a terra, semear, cultivar novas crenças, novos conhecimentos. Posso dizer que amadureci. Costumo dizer que às vezes nem lembro quem eu era antes de Caio chegar. Tenho vagas recordações de uma menina muito mimada e intempestiva. Que teve que dar lugar a uma mulher responsável por si e pelo reflexo de suas escolhas em outra vida, solidária porque também viria a receber muita solidariedade, humilde porque alcançou a consciência de sua mera condição de aprendiz nesta vida.

Caio me apresentou gente que nunca imaginei conhecer. Me motivou a fazer ações entre amigos e exercer liderança em alguns momentos. Me fez encontrar a espiritualidade e desenvolver minha intuição, para meu imenso fortalecimento. Me fez deixar os mimimis de lado e partir para a ação. Me faz ir em busca de sonhos antigos ou teoricamente impossíveis. Me faz ter fé na humanidade. Me ensina os valores de verdadeira justiça e amor incondicional ao próximo. Me reitera constantemente o conceito de coragem. Me faz amar a vida em sua simplicidade. Me permitiu me redescobrir. Me fez florescer.

Nada disso veio da noite para o dia. A semente teve que ser cuidada, entendida, regada, amada. Para que frutificassem na vida que temos hoje. Na mãe que conseguiu retomar a vida profissional 7 anos depois de largar tudo por este filho que exigia tantos cuidados, que reaprendeu a se amar e se cuidar para ainda melhor poder amar e cuidar esse filho tão maravilhoso que lhe foi destinado. No irmão que era criança e hoje é quase um homem, com valores de inclusão e igualdade impressos naturalmente em seu caráter. Em tantas pessoas que aprenderam alguma pequena coisinha com Caio, em alguma oportunidade que tiveram de se aproximar dele com o coração aberto – sempre lembro do querido exemplo da tia Dina... Que frutificou especialmente nele mesmo, Caio. O menino que não viveria um ano e hoje já passa dos 10. Que seria vegetativo e hoje freqüenta o terceiro ano de uma escola regular de ensino fundamental. Que segue evoluindo física e cognitivamente, florescendo a seu tempo.

Me sinto despedindo-me dos Meus Frutos. Gradualmente. Aceito cada vez mais nossa rotina com naturalidade e não existe mais a necessidade inicial de compartilhar tudo o que fazemos. Aceito a deficiência de meu filho como apenas uma pequena faceta do ser humano gigante que ele é. Estou ciente que nada parou. Que haverão novos desafios, novas provas, novos aprendizados. Mas, como sempre tentei escrever por aqui – para quem a vida não é assim? Eu, Caio, Yuri, somos iguais. Apenas mais uma família. Apenas três entre bilhões de pessoas no mundo. Não há mérito nem deferência em nosso caminho. Apenas há a estrada trilhada a nosso particular modo.

A nossa história? Não preciso mais me apoiar no que já foi. Cultivamos fé, amor e aprendizados, ao longo de 10 anos. Acho que um ciclo se encerra. Está na hora de colher os Frutos. E caminhar para frente, saboreando o que nos tornamos.


2 comentários:

Cláudia Fabris disse...

Como não ser tua fã incondicional, xará ?!!!!!!
E amar de paixão teus textos, todos eles ?!!!!
Tu é show de bola, mulher !!!!

Tatiani Fraga disse...

Incrível como muitas de tuas palavras, são a escrita do que o coração de muitas mães querem dizer... Parabéns por tudo que és, pela linda família!!!