quarta-feira, 9 de agosto de 2017

Para Caio

Faz tempo que não escrevo de ti, filho. E esse blog, esse espaço nasceu justamente por ti, que me fez entender a força e o valor dos meus frutos. Mas como tal, precisaram de tempo para maturar e serem saboreados. E a cada nova estação é possível que os ciclos se renovem e também alguns sentimentos adormecidos, aparentemente superados, renasçam.

Ontem tirei uma foto tua, como tantas que sempre tiro. Porque sou uma mãe assumidamente coruja. Porque tua alegria me comove e inspira. Tu estavas pronto para ir à escola. E eu fiquei profundamente tocada ao vê-la. Meu Deus, como tu é lindo, meu filho! Como teus traços são perfeitos! Como teu rosto se ilumina, com teu sorriso que nasce dos olhos, da alma!


Mas preciso te dizer, filho. Me doeu. Muito. Eu aceito, mas tem dias que dói bastante. Mortalmente. Tua deficiência. Tuas impossibilidades. Tuas limitações, causadas nessa vida por irresponsabilidade alheia. Sei, acredito mesmo, combinadas entre nós dois, muito antes. A gente topou enfrentar juntos. Mas ainda assim me dói. Porque vejo que tu tentas falar mais do que consegues hoje e não ser entendido te frustra. Porque te esforças pra que teu corpinho responda além do que ele tem conseguido. E porque todo nosso empenho não tem dado os resultados mais desejados. É duro conviver com desapontamentos. E ser feliz apesar deles. Vendo por este ângulo, acho que até que estamos nos saindo bem.

Ainda assim, quero te pedir: me desculpe. Me desculpe porque ando muito cansada. Cansada dessa rotina estressante de horários cronometrados para tantos compromissos de reabilitação. Cabeça cansada de sempre criar o plano B, o C, quase esgotando o alfabeto, buscando mais e mais oportunidades para que desenvolvas o teu melhor. Cansada de andar de ônibus, de olhares preconceituosos ou de comiseração, de correr atrás de receitas médicas contínuas, de andar sempre com o oxímetro na bolsa. Exaurida de pessoas que não têm sequer a dignidade de olhar para nossos sapatos, quiçá para calçá-los, e ainda assim emitirem opiniões e julgamentos. Que não sabem da missa a metade, porque não querem saber.

Me perdoa, filho. Quando reclamo de dores musculares pelo manuseio diário contigo. Porque né? Além de lindo, estás um rapaz, quase da minha altura! Te peço perdão quando choro de cansaço – escondida ou na tua frente. Me perdoa quando deixo prevalecer minhas vontades, meu bel prazer. É quase uma questão de sobrevivência, sabe filho? Me perdoa porque eu sei que disse que te carregaria em meus braços a vida inteira e parece que as forças me faltam demasiado cedo. Me perdoa se eu aprendi tanto com tua coragem, mas ainda assim, não sou sombra da fortaleza que tu és. Sei que as minhas limitações são infinitamente maiores que as tuas. Te venero por isso.

A tua imagem tão linda dessa semana doeu meu coração. Repito: como tu é lindo, meu filho! E como é imenso esse amor que te tenho! Esse amor que tem se sentido impotente, mas que é tão visceral. Que só a gente sabe, porque só a gente vive. Não tem sido nada fácil, né filho? E o mais incrível disso tudo: somos peculiar e genuinamente felizes. Eu te agradeço por não desistir de mim. Eu te agradeço por ter me escolhido. Te agradeço por dar a tua vida para eu me tornar melhor. Te agradeço por tua luz acolher minha sombra. E juntos sermos completos.

Eu te amo. Obrigada por me permitir isso.

Mamãe (uma das poucas, mas lindas palavras, que tu consegues dizer) 

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