Eu
evito entrar em polêmicas. Mas tem horas que simplesmente não consigo me calar.
Numa época em que a liberdade de expressão é tão alardeada, eu não agüento ver
o que na verdade é tão somente a opressão digital. Nas redes sociais, se
convocam militantes para determinadas opiniões. E aqueles que discordam são
massacrados em IP público! São excluídos, xingados, tachados de retrógradas. E,
como sempre, é a mulher (especialmente aquelas que optam pela maternidade) o
alvo mais frequente.
Pois
eu me irrito profundamente com as defensoras ferrenhas do parto domiciliar como
a única possibilidade de uma maternidade plena. A minha opinião é a de que a
medicina não é vilã. É aliada (ainda que erros médicos ocorram, mas ainda
credito isso à inerente falha humana).
Na
minha primeira gravidez quis muito o parto natural. Era meu sonho de consumo
baseado nos relatos de minha mãe, que me ganhou, primeira filha, num parto
vaginal facílimo, rápido e praticamente indolor. E que teve meu irmão numa cesárea
de emergência que lhe causou infecções, dores e a necessidade de outras
cirurgias reparadoras ao longo da vida. Mas não foi possível. Meu útero
simplesmente não dilatou, nem com o uso de ocitocina e uma espera de horas,
permitido dentro da segurança médica, pela obstetra para me mostrar que não, eu
não conseguiria parir naturalmente. Yuri veio ao mundo de cesárea. Nasceu
lindo. E poucas vezes soube de um bebê mais tranqüilo do que ele. Não chorava.
Não sofreu de cólicas. Era sempre muito calmo e feliz.
Na
gestação do Caio, eu já esperava naturalmente por uma segunda cesárea. Que me
foi negada pela equipe médica de emergência que me atendeu com rompimento total
de bolsa, porque a gravidez não tinha ainda 34 semanas como “manda” as
cartilhas médicas. Entrei eu e o bebê em sofrimento e uma angustiante espera de
3 dias. Caio finalmente veio ao mundo de parto normal. Quase morto. Cianótico,
não chorou. Descrito como negro na sua declaração de nascido vivo. Foi esta
falta de oxigenação prolongada que lhe causou a lesão cerebral que comprometeu
sua vida para sempre.
E
aí eu pergunto: valeu à pena? Porque eu não sou uma estatística mínima. Cerca
de 90% dos casos de paralisia cerebral são decorrentes de problemas no parto ou
logo após ele. Somente 10% tem relação com má formação fetal ou alguma doença
congênita no bebê. E ainda que eu fosse uma estatística mínima, o meu
sofrimento de mínimo não teve nada. Caio, hoje tenho plena consciência, é uma
benção em minha vida. Mas que me foi dada a custo de muitas lágrimas, muita
dor, muita luta.
Yuri
foi amamentado no peito por um ano. Exclusivamente no peito por 6 meses, como
reza a cartilha da mãe perfeitinha, sem conhecer água ou chás neste período.
Caio
não pôde receber leite materno em seus primeiros dias. Depois, só por sonda.
Perdeu o reflexo da sucção e logo adotou a mamadeira. Num esforço que só mãe
faz ainda consegui dar meu leite mais complemento por 3 meses. Depois,
mamadeira direto. E como recebi críticas por isso! “Ele é prematuro! Precisa
ainda mais do teu leite!” Não brinca? Nem tinha percebido...
Eu
acho que parto e amamentação são momentos lindos. Mas são somente uma pequeníssima
parte do que realmente é a maternidade. Acho que Yuri foi uma criança doce, tranquila
e feliz, mesmo que tenha vindo ao mundo através de um bisturi que abriu meu
ventre. Veio ao mundo muito amado, recepcionado com abraços quentes de um
sentimento verdadeiro. E assim foi criado. Caio é um menino que cativa pelo sorriso, pela
alegria de quem também se sabe amado. O leite dado via mamadeira, mas com o
amoroso contato olho no olho e aquele bater de coração de mãe que ele podia
ouvir sempre... ele sabe o valor que teve!
Ou
seja: tenho dois filhos lindos, sadios, equilibrados, criados num ambiente de
amor. Embora minha trajetória como mãe de ambos tenha sido exatamente oposta. Por
isso, fico pra morrer quando vejo julgamentos tão severos a respeito da conduta
de nossas semelhantes, outras mulheres, frente ao parto e amamentação. Cada um
vai do que jeito que pode, do jeito que dá conta. A história que temos para
construir com nossos filhos é para uma vida inteira. Acho cruel essa exigência
da maternidade perfeita, personificada em parto natural e amamentação
exclusiva. Pra mim, maternidade perfeita é aquela exercida com o coração. Com
muita vontade de acertar, por amor incondicional àquele serzinho que acabamos
de trazer ao mundo, mas sabendo que vamos falhar. E que isso não nos torna
carrascas. Só faz de nós o que somos: humanas.
Eu
sofro por cada jovem mãe que se deixa cair nesta neura de perfeição da “naturalidade”.
Natural é o vínculo que devemos criar com nossos filhos. Não imposto pela opinião
da moda, das antenadas, mas pela nossa real possibilidade. Deu pra parir
naturalmente? Excelente! Não deu? Que venha com saúde! Amamentação exclusiva?
Perfeito! Complemento e mamadeira? Faça da amamentação, do jeito que for, um
momento de amor, esta é a vitamina realmente necessária.
Eu
cada vez mais tento vestir a camiseta da não-culpa. Faço o meu melhor como mãe.
Às vezes erro tentando acertar. Mas perfeita não sou, nunca fui, não ambiciono.
E saber disso, tira também dos meus próprios filhos uma carga que eles não
merecem. Temos uma vida inteira, muito além dos brevíssimos momentos do parto e
amamentação para exercermos nosso aprendizado de amor mútuo. Como dizem por ai:
fica a dica.
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