Claro que esses dias na praia foram, como afinal é nosso cotidiano, mais um teste drive pro espírito inclusivo do próximo. Mas eu vou contar, ô coisinha difícil de achar...
Fomos e voltamos de ônibus. Dá uma hora e meia de viagem, o coletivo nos deixa na esquina da rua da minha cunhada, onde o Sandro, que já estava lá, nos buscou. Super tranqüilo. Em tese.
Na ida, tínhamos comprado as passagens na rodoviária de Canoas, usei o benefício do passe livre – sim, eu preciso, só por esse e outros detalhes é que fomos à praia (casa emprestada da minha cunhada, pagando passagem só pro Yuri, despensa super abastecida e à nossa disposição...). Então, foram três bilhetes de ida: Caio, acompanhante (eu) e Yuri. E uma moça que insistia em ir à praia aquela noite, resolveu que iria mesmo que fosse em pé. O que não foi o que aconteceu na prática: ela queria mesmo era a poltrona número 1, destinada ao Caio. “Por que um ‘nenêzinho’ precisa de uma poltrona só pra ele? Pode ir no colo,na boa”.
Na boa, digo eu! Não tenho que me justificar, não tenho que contar pra todo mundo que ele está próximo de completar 5 anos, que tem uma deficiência grave. Não tenho a obrigação de me expor 24h, ao vivo (ok, faço isso aqui, no meu canto, mas não tenho síndrome de BBB). Me cansa ter sempre que justificar como vivemos, porque vivemos, de que modo sentimos a vida. Mas, até por cansaço antecipado, engoli tudo e respondi delicadamente à moça: Ele está apenas exercendo seu direito de ocupar um banco individual.
A volta foi mais conturbada, porque não tinha como reservar os lugares. A gente compra os bilhetes e vai sentado quem entrar primeiro no ônibus. Quando vi que ele já chegava bastante cheio, perguntei ao motorista se o Caio não teria prioridade. Ele me respondeu “até que sim, mas a senhora tem que entrar ‘duma’ vez com ele ou esperar o cobrador pra lhe auxiliar”.
PQP! O cobrador em questão estava envolvido em ajeitar as malas das mais de 10 pessoas que queriam embarcar no ônibus, além de nós. E nisso, a maioria delas passava por mim e pelo Caio às cotoveladas! Não seria obrigação ou, no mínimo, civilidade, que esse motorista me ajudasse à embarcar com o Caio? Mais adiante, na viagem, ouvi esse mesmo motorista comentar que “basta a criança não falar que a mãezinha já se julga no direito de atendimento preferencial”. Minha vontade foi esfregar a carteira de passe livre intermunicipal do Caio na fuça do sujeito até ela desmanchar! Pôxa, temos direito à ela! E não só pela deficiência em si, cumprimos exigências sócio-econômicas definidas por lei para tê-la!
Eu pensei em bater boca com o motora. Pensei seriamente em mandar um email cabeludo pra Unesul (empresa do ônibus) com data, horário e detalhes primorosos. Mas, na maioria das vezes, canso antes de começar. Ter um filho com as necessidades do Caio é maratona das grandes. Cansa agendar, levar nas terapias. Cansa, às vezes, pesquisar e ir atrás de alternativas de novas terapias que não podemos pagar. Cansa ter medo de crises convulsivas, de glaucoma, de refluxo... Cansa as noites sem dormir, as constantes e necessárias revisões médicas.... Isso, sempre é bom lembrar, apesar do meu imenso e verdadeiro amor por ele. Uma coisa (cansaço natural da situação) não exclui a outra (o amor incondicional). Porém NADA me cansa mais do que a falta de tolerância entre os homens. Porque eu falo muito em inclusão... só que quando me pego pensando à fundo nesses acontecimentos, não sei se isso é tão somente a inexistência dela na prática. Olhando assim bem de pertinho, parece que tudo isso realmente acontece porque, como já estou cansada de saber, a maioria das pessoas desconhece o respeito ao próximo, a gentileza, a solidariedade. E eu desconheço doença mais grave do que essa.
2 comentários:
Entendo o que vc quer dizer perefeitamente. Lu não gosta de lugares com muita gente mas até que tem evoluído. Começou a falar com 5 anos então passamos por muitas dificuldades. Depois trocava algumas letras e até hj muitas pessoas não entendem o que ele fala...
Quantas vezes ele entrou em crise nos supermercados, festas de escola, festas infantis, casa dos outros, rua... muitas vezes achavam que a gente espancava ele e eu escutava: criança birrenta, criança sem educação, dá pra calar a boca desse moleque, coitado, faz alguma coisa, ele tá chorando demais (como se eu não estivesse vendo) e etc... um dia, eu tava levando inúmeros chutes calada e uma babá de outra criança disse: vc tem que ensinar ele, não pode deixar ele te bater assim... E eu louca pra explicar sobre o autismo, sobre ele não saber expressar os sentimentos e etc... mas cansa, cansa tanto que eu continuei calada, apanhando até ele se acalmar...
Uma amiga minha fez um panfleto e ela entrega nas ruas, nos hotéis, pros outros hóspedes, na escola, etc explicando sobre o autismo e falando do filho. As vezes não dá tempo nem de nos denfendermos, então, entregamos o panfleto... é bem útil. A Inclusão social está só no papel... infelizmente. Mas, o amor incondicional faz vc passear com seu filho e alegrá-lo mesmo com tantas dificuldades... aí, mesmo cansada, quando olhamos pra um sorriso da nossa criança, o nosso coração acelera... não tem preço... dá até pra esquecer por segundos esse povo sem educação e as vezes precnceituoso. Beijos!
Puxa, seu texto é um desabafo motivante. Parabéns pela ousadia! Força e coragem!
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