quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Transição

Esta semana aconteceu minha primeira reunião com duas profissionais do CEIA - Centro de Educação Inclusiva e Acessibilidade. Sub-departamento da Secretaria de Educação do município, tem dado amparo à mesma em casos de alunos de inclusão da rede pública de Canoas. Tive um encontro com uma psicomotricista e uma fonoaudióloga. Claro que, ansiosa-mor (vocês já tinha reparado nisso?), eu estava em cólicas. E com medo. Acho que Caio foi tão abençoado na sua iniciação escolar, com o mérito total para a equipe da sua escola de educação infantil que há um lado negativo meu que acha praticamente impossível nos darmos tão bem na nova escola, que ele iniciará ano que vem, agora no ensino fundamental.

Mas as gurias do CEIA me tranquilizaram muito. E conseguiram o mais improvável: me deixaram confiante de que sim, pode continuar dando certo.

Começaremos muito em breve, provavelmente agora em outubro, a transição do Caio para a nova escola. Ele vai frequentar uma vez por semana, a fim de promover a familiaridade dele com os espaços e as pessoas. E vai permitir também que a escola comece a se adaptar a ele, podendo estudar quais adaptações físicas ou humanas se farão necessárias para sua plena inclusão em 2013.

Fico feliz. Ele realmente está sendo tratado em sua individualidade. Estamos tendo o acompanhamento de profissionais que entendem não ser somente lei, mas também viável, que ele curse a escola. Que aprenda mais. Que cresça.

Entre suas especificidades mais difíceis, claro, a epilepsia e o uso contínuo de medicação;  a alimentação restrita; a ainda falta de autonomia para se alimentar e fazer sua própria higiene. Entre as vantagens: a boa socialização e a capacidade de entendimento que ele tem mostrado até então.

Ano que vem meu mocinho inicia então o primeiro ano. Com a distinção bem clara de que não se espera dele o que é convencionado: a alfabetização pura e simples. Mas se ele mostrar potencialidade, todos os esforços serão empreendidos. E se esta promessa for cumprida, já estarei realizada, pois é a materialização do meu compromisso maior com meu filho - o de tentar sempre, o de buscar mais, o de sonhar alto. Em princípio, quero dois filhos "doutores". E concentro todos os meus esforços neste objetivo, para ambos.

Estou apostando mais uma vez. E não estou só, o que é muito encorajador mesmo. Então, novamente, rendendo meu reconhecimento a este belo trabalho da educação municipal de minha Canoas que tanto amo. Que pode sim, vir a se tornar, que sabe, referência para todo o país. 

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Todos os dias para a igualdade

Na sexta passada, dia 21, comemorou-se o Dia Nacional de Luta das Pessoas com Deficiência. Eu acho bacana e, mais do que isso, fundamental divulgar datas assim. Ainda que eu concorde em parte com algo que li certa vez: os dias que são comemorados são os de minorias. 

Ok, abstraia-se daí as datas explicitamente comerciais: dia das Mães, dos Pais, dos Namorados, etc. O dia da Mulher, por exemplo, é uma visão machista, antiga e estereotipada de nosso papel na sociedade. O dia do Índio, outra data que não há nada a comemorar, visto que nosso país não oferece nenhuma política pública eficaz de preservação à cultura destes povos. Enfim.

Como mãe de uma criança com deficiência, acho sim, importante ter um dia assim. Também teve o dia mundial da Paralisia Cerebral. Tem do Autismo. Hoje mesmo, dia dos Surdos. Bacana porque são oportunidades de lembrar o mundo que existe a diversidade. E que estas são pessoas que podem ser atuantes, úteis, felizes, plenas como as demais, a despeito da deficiência que venham a ter. Acho que estas comemorações são ótimas oportunidades de ensinar mais sobre o que ainda é desconhecido de uma maioria. E não porque os portadores de deficiência sejam minoria, afinal, segundo o Censo 2010 do IBGE, somente no Brasil eles representam quase 25% da população. Mas porque ainda existe o preconceito e eu tendo a crer que ele ainda é mais fruto da desinformação do que da má vontade simplesmente. E que datam assim sirvam para que seja lançado um olhar mais cuidadoso do poder público para as nossas lutas que, longe de ter um dia, são as batalhas do cotidiano.

No entanto, sou obrigada a confessar que no meu mundinho ideal, aquele que sonho, quero ainda uma sociedade sem calendários a lembrá-la do valor e dos direitos do próximo, seja ele quem for: índio, negro, caucasiano, mulher, homem, deficiente, atleta...

Tenho divulgado muito esta imagem, pois acho ela a síntese perfeita do que quero dizer: Caio brincando de igual para igual com outras crianças, no parque, num brinquedo adaptado a cadeirantes que permite sua perfeita interação. 



Eu sonho este mundo para o meu filho. Onde ele seja apenas visto com igualdade. Que seus direitos sejam plenamente respeitados. Sem vantagens ou benefícios diferenciados. Quero para meu Caio apenas a igualdade de oportunidades. O acesso à saúde, educação, ao lazer, às brincadeiras de criança. Quero apenas que ele possa sorrir como qualquer menino de 7 anos merece. Não quero que lhe lancem olhares de admiração, espanto, comiseração. Quero apenas que ele possa ouvir mais vezes, perguntas simples e lindas como a desta inesquecível tarde: "Oi, como é teu nome? Vamos brincar?".

domingo, 16 de setembro de 2012

O não que abre portas


Certa vez li um texto da Martha Medeiros que adorei. O nome é “Quanto vale um sim”. Dizia, resumidamente, que a vida só segue para quem não supervaloriza o não, porque muito o escutamos ao longo da existência. Que o transformador é o sim.

Eu acho que sim, é bem assim.
Eu acho que não, nem sempre é assim.

Esta semana, falando ainda da felicidade de ter conseguido o apadrinhamento pra equoterapia do Caio, lembro que só foi uma conquista possível devido a um não. Eu já conhecia o trabalho da Hípica de Porto Alegre e da Cavalo Amigo há anos. Foi através de conversas com a equipe deles que conheci a possibilidade de apadrinhamento e me inspirei a criar o vídeo com tal propósito. Daí em julho deste ano, fui convidada para ir até lá com o Caio. Seria feito um vídeo com crianças em busca de padrinhos. Este vídeo será levado pela Cavalo Amigo para empresas diversas. Eu delirei de alegria! Acertei tudo e no dia combinado, dia 20... deu tudo errado! Três carros vieram nos buscar e um furou o pneu, o outro estragou, por fim nos perdemos pelo Google Maps... Cheguei meia hora depois da equipe de filmagem encerrar as atividades.

Fiquei muuuito frustrada. Chorei. Deprimi mesmo. Era algo que eu queria muito para o Caio. Pensei no porque ter sido convidada e não ter conseguido chegar... Porque criar uma expectativa e ela acabar sem nem mesmo começar direito.

Passados uns três dias de luto, reagi. Eu não queria a equoterapia para o Caio. Eu quero! Aquele não, não ia me fazer desistir! Se cheguei até lá, se recebi este novo cutucão do destino, algum propósito deveria ter nisto tudo... É bem aquela história de que quando Deus fecha uma porta, Ele abre uma janela. As oportunidades existem! Mas nós precisamos ir atrás delas e não esperar que nos caiam no colo!

Esta é a grande lição que gostaria de passar para as pessoas. Não importa quão difícil pareça sua vida. Quão inatingíveis pareçam seus sonhos. Desistir é sim, para os fracos! Transformar o não da porta fechada na janela por onde entra o lindo e quente sol depende de nós. Ou olhar o não da porta fechada e brigar mesmo: não aceito, vou abrir!

Se eu tivesse recebido um sim da vida naquele 20 de julho, provavelmente eu estaria bem calminha, acomodada, esperando até hoje o resultado da (louvável) iniciativa da Hípica. Como eu recebi um não, vi que era preciso lutar mais pelo que queria. E posso assegurar: o sabor da vitória impulsionada pela vontade de contrariar as estatísticas do não é uma delícia, sim!

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

O segredo do sucesso


Todo mundo acha que sabe o que é sucesso. Se não numa palavra ou num conceito propriamente dito, num contexto. Sucesso é ter fama. Reconhecimento. Dinheiro, por que não? Seria o sucesso também ser admirado, imitado, citado?

Nos meus inocentes suspiros adolescentes, eu sonhava ser jornalista e, mais tarde, publicitária, curso superior que de fato conclui. Mas eu sonhava muito alto. Sonhava em ser famosa, rica, premiada em Cannes, entrevistada em revistas de cunho intelectual ou empresarial. Me imaginava dando palestras, viajando o mundo. Hoje, rio disto tudo. De tanta inocência mesmo. E de tantos estereótipos. Mas durante muito tempo, não ter trilhado este caminho me fez sofrer.

Olhando para trás, vejo que não me dediquei à carreira como deveria para atingir tais objetivos. Não a priorizei nunca. Minha família, minhas realizações pessoais e minha consciência sempre estiveram em primeiro lugar. Quando eu tinha apenas 23 anos, eu larguei uma agência onde eu estava indo muito bem, com reconhecimento de clientes importantes como a redatora favorita deles. Deixei o emprego para cuidar da minha avó de criação, então com 86 anos. Fiquei 6 anos longe do mercado de trabalho. Porque, nesta “brecha”, optei então por cuidar 100% de outros sonhos: casei, tive meu primeiro filho, cuidei dele por um ano. Só depois que minha querida vó Piti partiu, retomei a vida de publicitária. Que durou mais 5 anos, até a gravidez inesperada do Caio. O parto prematuro e tudo que adveio dele, me deixou mais um ano em casa. E lá fui eu tentar ser uma profissional de sucesso outra vez.

Mas, confesso, depois da chegada do Caio, nunca mais fui uma publicitária em paz. Até tive momentos de satisfação porque, sim, ainda existia (e deve existir sempre) um ego que gosta de reconhecimento e elogios. Cheguei a chefiar uma equipe de criação. Fui promovida à gerente de filial! Só que todo dia, ao chegar em casa e ver aquele meu pequeno, tão guerreiro e tão frágil ao mesmo tempo, eu me questionava se estava fazendo a escolha certa. Fui muito profissional e me orgulho disto. Jamais deixei cliente na mão ou trabalho pendente, mesmo nos piores momentos, com as primeiras crises convulsivas, a hepatite medicamentosa, o retorno à UTI pediátrica. Sempre repassava tarefas e deixava um sucessor devidamente qualificado para assumir o andar da carruagem. Mas meu coração de mãe sofria. Se cobrava. Até que dois anos depois, voltei pra casa. Dessa vez para ficar.

Lá se vão quatro anos e não foi uma escolha pacífica. Sempre me perguntava o que estava fazendo com tantos anos de estudo, com tanta dedicação ao meu sonho de ser publicitária. Com o rumo que o primeiro e festejadíssimo diploma universitário de minha família tomou... Achava que ser “só” dona de casa era um atestado múltiplo. De fracasso. De incapacidade de lidar com a maternidade. De comodismo.

À medida que os anos foram passando e as coisas acontecendo, fui encontrando mais tranquilidade na minha escolha. E entendi que nunca houve escolha. Não poderia haver. Meus filhos eram minha escolha primordial. Especialmente no caso do Caio, não sou nem um pouco modesta em ter certeza que é a minha participação integral em sua vida, em seu cotidiano, que ajudaram a transformar 80% de área cerebral lesionada em apenas 5%. Sei que é meu amor, estímulo maior em forma de presença diária, a terapia transformadora que leva um menino inicialmente condenado a viver de modo vegetativo a romper mais e mais barreiras. Não tenho a menor dúvida de que é a minha escolha por ele o combustível daquele sorriso lindo.

E aí volto a me perguntar: o que é o sucesso? No meu caso, é ver que faço o melhor do que me propus a fazer. Que tenho talento para lidar com as adversidades, criatividade para lidar com as crises, persistência para empreender nossas lutas. Tudo com uma alegria talvez maior do que a que sonhei encontrar na minha profissão. Meu diploma foi em vão? Não acredito. Minha formação faz de mim uma mãe curiosa, inquieta, que busca informação em todos os meios. E alguém diga que deixei de fazer campanhas? Recém citei no post anterior a banhita, o caipira, o sonho conquistado da equoterapia através de um vídeo “promocional” de Caíto... E talvez algo maior, que seja dividir a minha luta por aqui, nas redes sociais, através de palavras que se tornaram a minha própria vida. É saber que tudo valeu a pena. As experiências, o estudo, as amizades. As dores. Os sustos. Tudo é aprendizado. Sucesso, paro para pensar, é ser feliz em nossas próprias escolhas.
Então, está tudo certo.

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

A Internet do Bem

Eu sou uma otimista. Procuro ver sempre a metade cheia do copo. E a vida me tem me provado que não estou errada em ser assim.

Sou uma fã da internet. Deslumbrada mesmo. Acho fantástica a interatividade que ela permite; a quebra das barreiras físicas, sociais e geográficas. Sou uma apaixonada pelo modo como as relações humanas têm se desenhado através dela. As redes sociais me fascinam. Muito me ensinaram – foi através do “falecido” Orkut que entrei nos primeiros grupos de pais de crianças com paralisia cerebral, portadores de deficiência e pude começar a entender melhor o universo que eu e Caio teríamos de enfrentar. É através de amizades feitas on line que encontrei terapias, dicas de alimentação, de remédios, indicação de médicos.

Então, unindo estes dois sentimentos, eu acredito no quanto a internet é benéfica. O quanto veio para servir, unir, somar. Claro que, como tudo, sempre tem gente que faz mau uso da ferramenta. Uma pena, mas é da natureza humana. Mas eu ainda penso que o seu poder para fazer o bem é maior.

Há mais de quatro anos fiz um vídeo contando a história do Caio e meu desejo de que ele pudesse fazer equoterapia. Tratamento com cavalos que dizem é fantástico, especialmente para casos como o dele, que não tem ainda o controle de tronco. Se Caio ainda tem alguma chance de andar ou de, ao menos, vir a sentar sem apoio, ela passa pela equoterapia. O problema, como em quase tudo que diz respeito ao suporte a portadores de deficiência é o preço. Nossa chance seria o apadrinhamento por uma empresa que, conforme a Lei 9.249, poderia abater o valor investido do Imposto de Renda.

E lancei esse vídeo por email. Encaminhei a todos os meus contatos, pedi que o replicassem mundo afora. Nada aconteceu. Mas meu sonho não morreu. E motivada por recentes reportagens sobre o assunto, mais uma vez trouxe o vídeo à tona, através do Facebook. E em menos de 10 dias, aconteceu. Um amigo de uma amiga que compartilhou o vídeo, empresário, ligado ao ramo de cavalos, se interessou e entrou em contato. Mais uma semana, nos conhecemos pessoalmente e o sonho virou realidade: Caio conseguiu um padrinho!

Desde então Caio tem frequentado a Sociedade Hípica Porto Alegrense, na Cavalo Amigo. E eu ainda estou flutuando! Mal posso acreditar que conseguimos, graças a um coração generoso.

Caio já conseguiu a banhita através de campanha feita na internet. Já foi Caipira da escola. Sonhos que tínhamos e que não tínhamos condições de realizar. Mas já cantarolava Raul Seixas “sonho que se sonha só é só sonho que se sonha só, sonho que se sonha junto é realidade”. E ver este sonho que me parecia tão grande, tão distante, realizado, me faz ter um sonho ainda maior: uma ONG ou algo assim para outras mães, outras crianças com deficiência. São tantas necessidades que a gente passa. São medicações, alimentos especiais, equipamentos como a própria banhita. Necessidades que o governo não supre. Só lá na Hípica, 300 crianças aguardam a mesma benção que Caio, a de encontrar um padrinho que lhes proporcione esta terapia fundamental. Mas os exemplos vividos me mostram que existem pessoas que querem fazer o bem, querem ajudar. Às vezes elas só não sabem como, ou por onde. 

Como diz aquele comercial de refrigerante que ficou célebre (e adorado na internet), os bons ainda são maioria. Que bom!